Sobre a Pandemia – Carta de nosso Pároco

São Paulo, 19 de março de 2020

Queridas famílias,

Por meio das seguintes linhas, quero fazer algumas reflexões com o intuito de ajudar-lhes a aproveitar bem estes dias de confinamento forçado.

Não há dúvida de que nenhum de nós esperaria viver uma quaresma e Semana Santa nestas circunstâncias.

Estive rezando muito e creio que temos em mãos uma excelente oportunidade de retirar para a nossa própria vida e a vida de nossas famílias, um ensinamento maravilhoso.

Todos nós nos sentimos impotentes diante da realidade que temos que viver. Percebemos que somos muito frágeis e nesta fragilidade, recorremos uma vez mais à nossa fé.

Muitos de nós certamente relembramos aquela famosa frase do apóstolo Paulo: “Porque quando estou fraco, então sou forte” (2 Coríntios 12:10).

O apóstolo Paulo sente e compreende que nos seus sofrimentos o poder de Cristo estava operando. Ele diz ser forte na fraqueza porque a graça do Senhor não depende das habilidades humanas. Então ele se contenta em sua limitação, pois apesar da fragilidade humana, o poder de Cristo segue operando ativamente em sua vida.

A realidade é que às vezes o Espírito Santo nos enriquece com alguns dons: carismas, graças, inspirações, etc. Mas, outras vezes, o Espírito Santo nos empobrece, nos faz tomar maior consciência de nossa radical miséria. A ação do Espírito às vezes é sensível, e às vezes é escondida, às vezes é gozosa e às vezes é dolorosa. Pouco interessa que a ação do Espírito seja perceptível por nós ou não, que seja consoladora ou nos coloque à prova. O importante é que ela é sempre fecunda se a recebemos com fé e amor.

O momento que nos toca viver hoje, nos coloca em nosso lugar, pode ajudar-nos a sair de nossa avareza e de nosso egoísmo. Pode nos ajudar a ver que se o Senhor não constrói a casa, o trabalho dos construtores é vão. Se o Senhor não protege a cidade, de nada adianta guardá-la com sentinelas. (Salmo 127; 1-3).

Tenho observado que nestes dias muitas pessoas estão aprendendo também a receber, estão aprendendo a deixar-se amar, estão abrindo uma porta para a humildade, que pode dissipar de suas vidas o orgulho e a arrogância.

Assim, do meio da escuridão, está brotando uma nova luz, uma luz que dissipa toda escuridão. Talvez este seja um momento para compreender, pela dor, o verdadeiro mistério da Páscoa.

Talvez Jesus esteja nos convidando agora, a acolher em nossa própria vida, a Páscoa. Nos convida a tomar desta vez do seu próprio cálice, nos convida a subir juntos o calvário.

Ele escolheu os pregos, escolheu a coroa de espinhos, e nos convida a fazer o mesmo. Nos convida a tomar a nossa própria cruz porque nela também somos Ele.

Precisamos confiar em Deus; “Aonde iremos Senhor? Só tu tens palavras de vida eterna!”

De tuas mãos aceito Senhor, tudo, tal como venha, porque confio que tudo vem para o meu próprio bem…

Só se aprendermos a receber, aprenderemos a dar!

Por isso, nesta quaresma, eu os convido a fazer uma boa leitura destes acontecimentos que nos envolvem, sob a luz de Cristo.

Deixemos surpreender-nos pelo Cristo mutilado, com os olhos ensanguentados, que nos olha da Cruz. Que este olhar nos transpasse e nos ajude a reconhecer a nossa própria humanidade necessitada de redenção.

Todos precisamos de uma cura mais profunda que a cura da epidemia. Esta cura, só Cristo pode oferecê-la. Aceitemos esta cura que renova o coração e infunde vida nova para levar adiante a nossa verdadeira missão.

Não permitamos que as preocupações desta época tão tormentosa nos desanimem, não nos preocupemos pelo amanhã. Peçamos a Deus a graça de seguir aceitando e confiando que a vida é sempre um bem, independentemente das circunstâncias que hoje temos que viver. Façamos aquilo que devemos fazer e o resto o encomendemos a Deus.

Esperemos com paciência passar este inverno, com a certeza de que as rosas voltarão a florescer!

Perseveremos na oração, renovemos a confiança de que Deus nunca nos desampara em nenhum momento, acolhamos com humildade este momento amargo do cálice que nos toca beber, obedeçamos as diretrizes que foram dadas pela Santa Igreja para o bem de nossos irmãos e nosso próprio bem, conservemos a paz interior, vivendo com amor o instante que nos toca viver, livremos o nosso coração dos apegos desnecessários, para que o Espírito Santo possa reproduzir em nós a verdadeira imagem que Ele quer e saibamos agradecer a Deus este momento que vem certamente para o bem de nossa própria alma.

Peçamos a Maria nossa mãe, que nos ajude a estar ao pé da cruz como ela sempre esteve e está hoje, ali onde sofre cada irmão nosso!

Com minha bênção sacerdotal,

Pe. Adilson Carraro, LC.

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